PORTUGUÊS
DESCEU O RIO AMAZONAS
©
Ilídio Martins/Luso-Americano
"Ao
fluir das águas, juntava-se a corrente da minha emoção. Era a
existência plena, no infinito tempo e espaço. A realidade
fantástica dum sonho, que foi alimento e vida. Doce cavalgada
para as raias do sublime".
Parecem
ter sido estas as principais razões que o levaram a descer o Rio
Amazonas, das montanhas geladas do Perú a Belém do Pará, uma
aventura em que à partida tinha uns escassos seis a sete por
cento de hipóteses de saír com vida. Munido de uma forte
determinação, Alfredo Nascimento, que este mês completou 48
anos, decidiu, aos 36 anos, e sem qualquer apoio, concretizar um
sonho antigo de criança, e ao mesmo tempo tentar provar que o
Amazonas não é só o mais caudaloso mas também o maior rio do
mundo.
Jornalista,
então a trabalhar na "Voz de Portugal", do Rio de
Janeiro, Alfredo Nascimento parece ter ficado definitivamente
marcado, na sua juventude, por autores brasileiros que escreveram
sobre a região do Amazonas, particularmente por livros como
"A Selva", de Ferreira de Castro.
Enfrentando
um sem número de perigos, alguns dos quais lhe iam custando a
vida - dos índios antropófagos aos remoínhos do rio, do jaguar
aos guerrilheiros do Sendero Luminoso -, Alfredo Nascimento
percorreu um total de 7.149 quilómetros, entre Setembro de 1979 e
Fevereiro de 1980, depois de ter estudado minuciosamente a
história e geografia locais.
Actualmente
a residir nos Estados Unidos, em Newark, Alfredo Nascimento
cumpriu o serviço militar obrigatório em África, na Guiné,
entre 1964 e 1969, no departamento de fotografia e cinema, onde
parece ter conquistado o gosto pela aventura e pelo risco.
Começando
a escrever aos 17 anos, para a Agência Portuguesa de Revistas,
Nascimento passou por publicações como o "Diário"
(Moçambique), "Estado de São Paulo", "Correio do
Planalto", "Fatos e Fotos" (Brasil) e pela revista
"Opção" (Portugal), tendo feito ainda trabalhos como
"free lancer" para as revistas "Gente"
(Portugal) e "Vistazo" (Equador).
Enfim,
currículo bastante para escrever "Da Nascente à Foz do
Amazonas - Uma viagem Fantástica", um livro agora dado à
estampa que conta essa "viagem impossível" pelo
Amazonas e que serviu de pretexto para uma conversa com o seu
autor.
DA ROTINA PARA A AVENTURA
- Como surgiu a ideia de descer o Rio Amazonas?
- Eu diria que houve dois factores determinantes. O primeiro era
um sonho que me acompanhava desde criança. Todos nós ficámos
fascinados com aqueles livros de aventuras - não vale a pena
enumerar agora os títulos - e houve um que me cativou
particularmente. Foi "A Selva", de Ferreira de Castro,
que dá umas fortes pinceladas sobre o que é a vida no Amazonas.
Houve outros autores também, igualmente brasileiros, como
Guimarães Rosa e Euclides da Cunha. Eu diria que este foi o
primeiro factor. O segundo foi de natureza profissional, meramente
profissional e até mais forte. É da condição humana termos
sonhos, alimentar os sonhos e morrer com esses mesmos sonhos. Mas
desta vez concretizou-se. O aspecto determinante - digamos assim
-, foi o de trabalhar há vinte anos em jornalismo, e achar que
não tinha feito nada que me merecesse a mim mesmo a condição de
jornalista. Tinha trabalhado dentro dos padrões normais, fazendo
o que os editores achavam que devia fazer, apesar de ser autónomo
em muitas publicações - como para a revista "Gente",
para o jornal a "Voz de Portugal", do Rio de Janeiro,
para a revista "Vistazo", do Equador, enfim, para uma
série de publicações. Mas, como sabe, em último caso temos que
"alinhar" no "diapasão" da publicação.
Então surgiu uma oportunidade de fazer uma coisa diferente.
SETE POR CENTO DE HIPÓTESES DE SOBREVIVER
- Apesar do lado profissional que viu nessa viagem, não teve
qualquer tipo de apoio da imprensa.
- Não. Eu trabalhava na "Voz de Portugal", do Rio de
Janeiro, onde tinha a incumbência de fazer uns cadernos dos
Estados. A determinado momento propus ao presidente - também
proprietário - esse trabalho. Fazer o percurso do Rio Amazonas,
desde a nascente até à foz. A proposta foi aceite com
entusiasmo, mas quando o presidente foi consultar as companhias de
seguros foi informado que a percentagem de sobrevivência era
mínima. Era de seis a sete por cento, o que tornou inviável
qualquer apoio. Então, o proprietário do jornal propôs-me, em
último caso, fazer a viagem à minha conta e risco, e depois
vender o material à empresa. Assim foi. Vendi os meus
"tarecos" - que não eram muitos - lá no Rio - vivia em
Copacabana, uma área de que gosto muito e que fui recordar há
pouco tempo -, e fui, como se costuma dizer, com o "couro e o
cabelo". Apanhei o comboio em São Paulo para Corumbá, de
Corumbá para Santa Cruz de La Sierra, já na Bolívia - o chamado
"trem da morte" -, subi até Cocha Bamba, na Bolívia, e
cheguei ao Lago Titicaca, o lago mais alto do mundo. A partir daí
apanhei o comboio até La Raya, e depois comecei a fotografar e a
anotar os mínimos detalhes. Fui um dia a pé, praticamente, até
que em Quitanis, a 430 quilómetros de La Raya, já pude ir na
minha jangada. Foi aí que comecei a sentir pela primeira vez a
verdadeira "força" do rio, que ali ainda se chama
Urubamba.
PREPARAR A GRANDE AVENTURA
- Que tipo de documentação reuniu antes de se meter nessa
viagem? Tinha ideia dos locais por onde ia passar, onde devia
começar?
- Sim. Eu tinha visitado três outras nascentes, que alguns
autores consideravam - cada um a seu modo - nascentes do Amazonas,
as águas mais longínquas do Amazonas, a nascente original do
Amazonas. Curiosamente, os livros didácticos americanos, talvez
porque essas nascentes estão bem mais curtas, isto é, significam
uma distância inferior para o Rio Amazonas, apontam o Nilo como o
principal rio do mundo. Mas há os livros da América do Sul que
já apresentam outras teses, inclusivé essa de que será mesmo o
Rio Amazonas o maior do mundo. De forma que visitei, "in
loco", essas nascentes, e andei pelos arquivos, bibliotecas,
organismos oficiais, pesquisando, documentando-me o melhor
possível. Já perto da fase final consegui umas credenciais de
alguns órgãos oficiais do Peru, mas devo dizer-lhe que isso de
nada me valeu. Aconselho os meus colegas jornalistas a não
incorrer nessa ingenuidade, porque, às vezes, isso até acarreta
problemas como, por exemplo, ter que responder a interrogatórios
do tipo "o que é que vem aqui fazer, porquê esta
área", porque, na verdade, aquelas áreas estão controladas
pelo narcotráfico, ou, melhor dito, estavam. Tanto faz ser o
homem que anda a limpar as ruas como o presidente da Câmara.
Está tudo sob controle. Qualquer estranho é sujeito a
observação, muito mais um jornalista.
"VI PEDAÇOS DE CORPOS HUMANOS DESPEDAÇADOS"
- Quando se documentou tinha, à partida, plena consciência do
risco, dos perigos que iria correr?
- Em primeiro lugar, os nove anos de África foram de uma ajuda
incalculável para a ideia desta viagem. Ao constatar, em teoria,
os perigos que iria enfrentar, posso dizer-lhe hoje que eles se
cifraram em vinte por cento dos perigos reais que depois
enfrentei, ou, pelo menos, que senti. Jamais poderia admitir, de
uma forma antecipada, calculada, que a jangada não tivesse, por
centímetros, entrado num remoínho, naquela "bocarra",
onde mais à frente vi pedaços de corpos humanos despedaçados.
Eu vi que as pessoas ficavam arrepiadas quando lhes disse que ia
passar em Pongo de Mainique, onde estão as quedas, onde todo o
caudal do Rio se abate e entra em infernais remoínhos. Foi aí,
justamente, que fui parar a um desses remoínhos, ao de maiores
dimensões, e onde a jangada não entrou porque era maior do que o
sugadouro (canais subterrâneos). Portanto, e respondendo
concretamente à sua pergunta, eu não tinha uma noção concreta
dos perigos que iria enfrentar. Mas há também outro aspecto. A
determinada altura da minha viagem estava completamente adaptado
às circunstâncias, e as dificuldades já não eram tão sentidas
como no primeiro mês.
- Como reagiram a sua família e os seus amigos quando
souberam desta "viagem louca"?
- De formas muito diferentes e distintas. Aqueles que me conheciam
sabiam bem que eu sempre tive propensão para a aventura - ou para
algo diferente - já desde criança. Deram-me acolhimento. Ainda
hoje recebo cartas das minhas sobrinhas - que têm doze e treze
anos, e na altura tinham três e quatro - a falarem-me do
Amazonas, do tio no Amazonas, etc. Acho que, se outra razão não
houvesse, esta satisfação pessoal já foi um bom prémio.
NAS MÃOS DOS CANIBAIS
- Qual foi o episódio mais dramático porque passou?
- Eu diria que foi aquele em que os canibais fizeram uma roda, em
que eu pensei que estava nos segundos finais da minha existência.
Chegaram, inclusivé, a pôr o arco e a flecha em posição,
pronto a disparar. De repente, desataram às gargalhadas.
Passou-se exactamente na chamada selva alta, numa região de que
não se tinha quase conhecimento nenhum, e onde estão aquelas
tribos mais agressivas, como os jívaros. Foram exactamente os
jívaros - soube mais tarde -, foi essa tribo que me fez essa
cena. Talvez que só quisessem apenas divertir-se com a minha
figura, e o facto de não possuir qualquer arma, nem sequer um
simples canivete, me tenha salvo a vida. Eles são pessoas com um
conhecimento perfeito do seu "habitat", do seu meio
ambiente, e têm a percepção de quem vai apenas por querer ir,
em paz, de viagem, e de quem vai para usurpar o seu território,
as suas coisas, e, às vezes, até parte das suas famílias. Mesmo
agora no Brasil há denúncias de que pessoas aparentemente
interessadas em preservar a selva amazónica cometem muitas coisas
indevidas, como abusar de algumas indígenas. Mas, e retomando o
episódio, ia na minha jangada, e, de repente, via-a crivada de
flechas, uma das quais atada a um fio de juta (espécie de junco).
Os indígenas puxaram, com grande alarido, a jangada para a
margem, e apanharam-me. Levaram-me para uma palhota, para as
cabanas deles, e começou o festim. Isto era quase fim de tarde, e
festa prolongou-se até talvez por volta das quatro da manhã.
PRONTO PARA O CHURRASCO
- Mas porquê a festa? Foi devida à sua chegada?
- Eu presumi que sim, porque eles fazem todo um ritual que eu já
conhecia, e soube mais tarde que eles começam por amputar os
membros da pessoa até que a põem em posição de churrasco, e
depois comem-na com uma degustação incrível. Só tive a
percepção de que seria isto que estou a contar - isto é
hipotético, uma vez que não nos podíamos comunicar (eles só
gritavam e bebiam muito uma bebida feita de raízes que se chama
marsato e ahuasca, uma bebida muito forte) - quando cheguei a
Manaus, dois meses depois deste episódio, e tive conhecimento de
que tinham comido cinco brancos da FUNAI (Fundação Nacional do
Índio). Soube que os indígenas fizeram dois ataques a esses
elementos e mataram cinco. Tive a sorte de entrevistar um
sobrevivente de um desses massacres, que me contou detalhadamente
como é que eles fizeram esses assados. Mas, voltando à história
dos canibais, do mesmo modo que me apanharam, com aquela algazarra
toda, um deles agarrou-me pela mão, como quem agarra uma
criança, e levou-me pelo trilho na selva até à jangada. Mas,
antes disso acontecer, aí umas duas horas antes, os indígenas
dividiram-se em dois grupos, pareceu-me que antagónicos. Um
quereria que eu ficasse por lá e outro não quereria. O certo é
que o resultado final foi esse. Deixaram-me ir embora, pensando
que a qualquer instante se viesse a repetir a cena. A partir daí,
com um desgaste físico e psicológico tremendo, fui indo num
remanso - o sítio tinha águas quase paradas, dando a impressão
que estavam paradas.
COMO ESCAPOU ÀS GARRAS DE UM JAGUAR E AOS GUERRILHEIROS
DO 'SENDERO LUMINOSO'
Outro episódio dramático foi o do jaguar. Começou a
acompanhar-me pela margem, e um vez chegou a encolher-se - suponho
que era para saltar para a jangada. Soube mais tarde que ele se
sentiu agredido com as remadas, porque, segundo pessoas entendidas
na fauna, o jaguar, também chamado tigre amazónico, tinha
bastante caça, pelo que não haveria razão para ele estar com
fome. Porque o jaguar ataca quando se sente agredido ou quando
está faminto. E depois em Letícia. Aí foram questões
ideológicas, não porque eu tenha manifestado qualquer tendência
religiosa. Foi um episódio com os guerrilheiros do Sendero
Luminoso. Naquela zona, guerrilha e narcotráfico está tudo
mesclado. Não se sabe quem é quem nisso, ou se um só elemento
representa as duas situações. Fui preso. Apanharam-me a
fotografar o lugar onde eles estavam, a fotografar os hidroaviões
- eles têm um aparato tecnológico que nem a trinta por cento as
autoridades conseguem fazer frente (aviões, helicópteros,
lanchas rápidas, etc.). Foi numa altura em que estava tudo calmo,
em que eu já ia a fazer turismo pelo rio. Vi um avião baixar e
fui acompanhando o movimento dele, de uma forma muito ingénua,
até que senti um objecto frio nas costas e vi um sujeito com uma
carabina. Perguntou-me o que andava ali a fazer e levou-me para um
lugar onde se encontravam outras pessoas, todas armadas. Havia uma
área onde estavam cobras, de muitas espécies, e ameaçou
jogar-me nessas cobras. Apelei. Disse que era um turista que
estava ali simplesmente a fazer umas fotos para o meu roteiro de
viagem. Aí vieram com outro tipo de respostas - que turismo era
para burgueses, que aquele sítio precisava de revolucionários e
não de turistas, etc.
- Alguma vez pensou desistir?
- Pensei. Simplesmente eu não podia mais desistir a partir
daquelas quedas mais acentuadas. A partir daí não podia saír do
leito do rio. As margens são completamente compactas,
densíssimas, e devido à ferocidade dos animais. A única
hipótese que tinha naquela altura era continuar viagem.
FUGIR POR SER OBRIGADO A CASAR
- Fala no livro que recusou um casamento. Conte lá isso.
- Isso foi ainda antes de iniciar a viagem, nas margens do Lago
Titicaca. Só mais tarde é que soube porquê. São os núcleos
tribais, os líderes, que elegem o pretendente para a noiva.
Atingida uma certa idade - acho que é 16 anos -, a rapariga fica
disponível para o casamento. Depois fica à espera de arranjar o
pretendente adequado, que pode até já estar escolhido há anos.
Naquele caso não havia noivo para três raparigas. Então os
líderes escolheram-me a mim para casar com uma delas.
- E como é que se desenvencilhou desse imbróglio?
- Fugi durante a noite, pelos montes. Só tinha duas alternativas:
fugir ou casar. Era obrigado a casar. Eles não queriam saber,
certamente, como era a minha cultura, os costumes. Fui escolhido e
tinha que casar. No início pensei que era uma brincadeira. Por
sinal até era uma rapariga bonita, mas a ideia não era realmente
casar.
- No fundo, o que é que pretendeu com essa viagem? Provar alguma
coisa si próprio?
- No fundo, foi isso mesmo. Foi a consumação desses dois sonhos
de que falei há bocado. Um sonho muito pessoal e um sonho
profissional. Acho que isso me deu um certo apego para outros
projectos.
SEM COMIDA A PARTIR DO QUARTO DIA
- De que é que se alimentava? Muniu-se de comida antes da viagem?
- Inicialmente, muni-me de rações como bananas, peixe assado,
arroz, tudo isso envolto em folhas de bananeira, que era uma
maneira de manter os alimentos mais frescos possível. Mas logo ao
fim de uns três ou quatro dias perdi tudo. A água
"varreu" a jangada e fiquei sem nada. Depois comecei a
apanhar os peixes do rio. Naquelas partes mais baixas podia
apanhá-los com a mão. Estripava-os, punha-os ao sol a secar, e
depois assava-os. Isso foi num período que ainda não tinha
possibilidade de recorrer às populações indígenas. Os menos
hostis acabam por fornecer mandioca ou milho, aquelas culturas de
subsistência que eles têm. Depois as missões, já naquela parte
menos crítica do percurso, acabam por dar-me sempre qualquer
coisa, sempre na base do peixe, que abunda naquelas áreas.
Depois, já talvez a um mês de viagem, já podia comer outras
coisas, como carne de gado bovino, filetes de um peixe muito
gostoso chamado "bacalhau tropical".
PASSEI TANTA FOME QUE JÁ NÃO TINHA QUALQUER VONTADE DE
COMER
- Alguma vez passou fome?
- Passei, diversas vezes. Houve três e quatro dias que não
comia. A determinada altura já não podia apanhar os peixes,
porque entretanto o rio já tinha piranhas, e eu receava o pior
desses peixes - que são carnívoros e não admitem o aproximar
das pessoas, e muito menos um derramamento de qualquer líquido
que lhes provoque o apetite. Depois houve uma altura em que passei
tanta fome que já não sentia qualquer vontade de comer. Isso
aconteceu-me talvez ao fim de oito nove dias. Encontrei depois uma
família de indígenas, numa canoa, e fiz-me entender, através de
gestos, através da minha precária situação - tinha uma figura
esquelética -, que queria comer. Levaram-me à missão dos
dominicanos, que a estava a um dia, mais abaixo, onde me deram
comida e me trataram - eu estava cheio de feridas - e onde fiquei
uns dez dias para recuperar, deitado, com assistência das irmãs
religiosas, que tinham instruções de primeiros socorros. Mas a
parte mais interessante nesta história foi o facto de ao fim de
uns três ou quatro dias não ter mais a sensação de fome.
Entrei num estado que se chama inanição, tanto mais que tive que
sofrer as inclemências do sol.
'A VIDA NÃO VALE NADA SE NÃO LEVARMOS POR DIANTE AQUILO
QUE GOSTAMOS DE FAZER'
- Afirmou, em entrevista a um jornal brasileiro, que pretende
voltar no próximo ano. Quis dizer exactamente o que? Repetir tudo
de novo?
- Não será a mesma viagem. Será um trabalho mais abrangente,
isto é, extra-rio. Dá-se conta, através da leitura do meu
livro, que a narrativa se prende muito com o rio, embora com
pequenas pinceladas extra-curso do rio. Mas, como dizia, pretendo
abarcar todo o processo amazónico num futuro trabalho, que vai
ser imediato, já no próximo ano.
- Vai voltar a descer o rio?
- Vou descer partes do rio. Vou ter que, lá mesmo, nas regiões,
saber as áreas que não representem um perigo grande. Porque se
representarem apenas perigo, eu vou. Vou porque a vida não vale
nada se não levarmos por diante aquilo que gostamos de fazer e
que achamos que devemos fazer. Acho que a nossa vida se valoriza
quando posta ao serviço de causas, pelo menos ao serviço das
nossas causas que consideramos dever levar por diante, embora as
nossas causas sejam para serem julgadas pelos outros. Acho que
não tem cabimento eu estar a dizer que vou dar cumprimento a uma
causa que interessa a a, b, c. Acho que isso não se ajusta à
minha maneira de ser. Portanto, eu quero fazer, uma vez mais,
partes do percurso, partes do Rio Amazonas, e incursionar por
aquela selva.
- Pelas partes mais perigosas? Porquê?
- Sim. Inclusivé para ter mais pertinência o trabalho. Falam
agora muito da extinção de certas tribos. Eu quero ver como é
que está isso. Quero ver até que ponto o trabalho dos organismos
oficiais do Brasil não é demagógico, até que ponto corresponde
a uma realidade. Porque o povo brasileiro é enganado muitas vezes
por uma doutrina oficial, o que não acontece só ali,
infelizmente. Mas esse povo, que é um povo bom, merece ser
informado.
'A MINHA FORMA DE SENTIR FICOU MAIS HUMANA'
- O que é que mudou na sua vida? O que é que mudou na sua
maneira de estar e de sentir depois dessa aventura?
- A minha forma de sentir acho que ficou muito mais humana. Houve
uma certa mudança no meu "feeling", na forma de encarar
certos aspectos, e também nasceu um outro respeito e
consideração pelas populações nativas, nomeadamente naquele
aspecto em que as populações são exploradas e não são
ajudadas. Eu diria que os governos - e quando falo em governos
quero dizer os amazónicos, os que têm áreas amazónicas (casos
do Peru, da Bolívia, da Venezuela, do Brasil, etc.) - vão lá
sacar os recursos naturais daquelas áreas, e deixam os indígenas
entregues à sua sorte. Um aspecto também muito curioso é o
facto de as populações da área brasileira estarem muito mais
conscientes, mais escolarizadas - sobretudo os jovens. É uma
viagem para se fazer outra vez.
LIVRO DVAI SER PUBLICADO EM DOIS PAÍSES
- Fale-me sobre o livro.
- O livro foi o epílogo de tudo isto que estivémos aqui a falar.
Em termos técnicos, parece que está bem impresso. A expansão
dele está a ser aguardada com uma certa expectativa, embora haja
contrato de publicação para pelo menos dois países. Eu gostaria
de realçar um aspecto que foi uma surpresa para mim. Como sabe,
todo o texto que entra numa editora sofre todo um processo de
revisão, que vai desde uma primeira leitura até à revisora, a
uma outra leitura, etc. Esse texto não sofreu alteração
absolutamente nenhuma. Foi apenas cortado um parágrafo,
simplesmente porque tinha desaparecido uma página e era
necessário dar seguimento à história. Fiquei surpreendido e,
conversando isso com o editor, uma pessoa com larga experiência
neste campo -, disse-me que a questão foi devidamente
equacionada, analisada, e verificaram que não havia nada a tirar
nem a pôr. "Você podia pôr muito mais, mas deixemos isso
para um próximo". Foi esta a resposta à questão que eu lhe
pus.
A
GRANDE AVENTURA NO LIVRO "DA NASCENTE
ATÉ À FOZ DO AMAZONAS - UMA VIAGEM FANTÁSTICA"
"Antes
de começar a minha viagem pelo rio Amazonas, devendo partir da
sua nascente, nos Andes, não houve uma única pessoa acreditando
que eu pudesse chegar ao seu termo, no oceano Atlântico.
Mas há momentos na nossa vida que se impõem como decisivos.
Achei que, finalmente, também para mim, tinha chegado a hora da
grande decisão: ficar ou partir? Viver resignadamente a rotina na
redacção do jornal, ou jogar numa só cartada todos os meus
sonhos e expectativas? Poderia perder. E se ganhasse?"
Começa
assim o livro de Alfredo Nascimento, "Da Nascente à Foz do
Amazonas - Uma Viagem Fantástica", publicada este ano pela
Editorial Nórdica, do Rio de Janeiro, livro que viu já os
direitos de publicação adquiridos para mais dois países.
Como facilmente se adivinha pelo título, trata-se de um livro que
nos conta a aventura de um homem que um dia decidiu pôr em
prática um sonho de muitos anos, mais exactamente a descida do
Amazonas, muitos milhares de quilómetros desde a sua mais
longínqua origem até à foz.
Com
uma lucidez e uma sensibilidade invulgares, Alfredo Nascimento
conta-nos como escapou da morte às mãos dos canibais, de ser
comido por um jaguar, e de como, por um triz, não foi engolido
por um dos muitos remoínhos desse imenso caudal de vida e de
morte.
É
um livro que nos conta a história dos povos e das gentes que
vivem o rio como vital para a sua existência, histórias reais de
gente real que vive entregue à sua sorte e quase parada no tempo.
É,
por último, uma história que nos conta uma aventura que deixou
marcas profundas no seu autor, vivas e inamovíveis, uma história
fantasticamente real onde a vida e a morte se cruzam e confundem e
se esbatem no mar da indiferença.
"O
pesadelo deve ter consumido toda a minha dose de adrenalina
daquele dia porque, durante os mais variados acidentes com a
jangada, não consegui ir além da indiferença. Familiarizava-me
com os remoínhos e a dançar sobre eles, temendo mais os remansos
do que as corredeiras e os choques contra as rochas. Comecei a ter
uma simpatia toda especial por aqueles sete troncos da balsa, a
despeito de ameaçarem desconjuntar-se a qualquer momento.
Quando a correnteza, exausta das suas próprias correrias, se
permitia longos trechos de calmaria, surgia à superfície,
provocadas pelo temporal, pequenas ondulações que chegavam a
confundir-me a respeito da direcção das águas. Nessas
situações sentia-me mais integrado naquela jangada açoitada
pelo vento/ e sem aparente rumo/ vivia-me fugaz como o tempo/ e
pelo microcosmo disperso como fumo."
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Não
Sei Porque Fui Dos Escolhidos Para Viver e Outros Foram Escolhidos Para Morrer
-
Joe Salgado, vice-presidente do Lar dos Leões de New Jersey, estava nas Twin
Towers no fatídico dia 11 de Setembro.
Saramago
e Eu
-
Crónica integrada num 'dossier' a propósito do Nobel da Literatura a José
Saramago.
Português
Desceu o Rio Amazonas
-
Entrevista com o autor do livro "Da Nascente à Foz do Amazonas - Uma
viagem Fantástica". Alfredo Nascimento, o autor, fala do livro e das
experiências únicas que viveu desde as montanhas geladas do Perú até ao
Brasil.
Algumas
Considerações Sobre os Emigrantes Portugueses em New Jersey
-
Oito questões acerca dos portugueses em New Jersey.
Pregar
no Deserto
-
Os portugueses de New Jersey.
Imigrantes
Lusos São Portugueses de Primeira
-
Crónica acerca dos direitos e deveres dos imigrantes portugueses nos Estados
Unidos publicada sob o pseudónimo de José M. Costa.
Dulce
Pontes Encheu o Prudential Hall e Encerrou da Melhor Maneira Programa Português
no N.J.P.A.C.
-
Dulce Pontes mostrou trabalho de grande qualidade e encantou milhares de
portugueses.
Sons
da Lusofonia Deram Música de Primeiríssimo Plano no N.J.P.A.C.
-
Mais um concerto memorável no New Jersey Performing Arts Center. Crónica
acerca do que vi e ouvi.
Pedro
Abrunhosa Mostrou que é Um Mestre na Arte da Sedução
-
Abrunhosa e os Bandemónio "mandaram abaixo" a sala do NJPAC. Mas a
mim não me convenceram. Crónica de mal-dizer.
O
Sentido da Diferença
- Crónica a propósito da recandidatura de Mário Soares à Presidência da
República.
O.
J. Simpson: O Julgamento do Século
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O julgamento mais mediático de sempre visto pouco tempo antes de ser conhecido
o veredicto.
Maria
João e Mário Laginha no N.J.P.A.C.: Duo Português Deu Lição de Bom Gosto e
Humildade
-
Duo português regressou ao New Jersey Performing Arts Center (New Jersey,
EUA) para mais um excelente concerto.
Um
"Santo de Carne e Osso"
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Crónica a propósito da visita a New Jersey do Padre Caetano, que se
auto-intitula "santo de carne e osso". Uma visita a uma das suas
"homilias" e uma consulta em privado.
Ex-Toxicodependente
Fala das Drogas e de Como Se Livrou Delas
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Entrevista com um ex-toxicodependente de drogas duras. A experiência da droga e
a receita da cura.
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Deram a Volta aos E.U.A. em 15 Dias
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A aventura de oito motociclistas portugueses e luso-americanos que percorreram
os Estados Unidos de mota.
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- A Gulbenkian mostrou um corpo de bailarinos de altíssimo nível. Mais um pé
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O duo português realizou uma performance notável no New Jersey Performing Arts
Center. Numa noite em que Betty Carter foi cabeça de cartaz.
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Grupo de Pedro Ayres Magalhães arrisca concerto com repertório praticamente
desconhecido. Cesária confirma o que se esperava.
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Roriz Mostrou no Victoria Theater Universo Muito Próprio
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A Olga Roriz Companhia de Dança mostrou em New Jersey um belíssimo trabalho.
Crónica de uma sedução.
Desencontros
-
História escrita a duas mãos publicada em 22 fascículos.
Polémica
Com Barroso da Fonte
-
Textos de uma polémica com Barroso da Fonte publicados no Semanário
Transmontano.
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